quinta-feira, 6 de julho de 2017

UM poema para HERMETO PASCOAL

Hermeto Pascoal
com o Berrante a me acompanhar
enquanto eu cantava a nossa parceria
 no
 
Teatro Rival





Poema de Numa Ciro


HOMEM SOM 

I
Quando o vento sopra na floresta,
a chuva chove no telhado
e alguém nos chama do portão...
É hora de afinar o nosso ouvido
e adivinhar quem está voltando
com notícias do Sertão.

II
Quando um passarinho canta livre,
a chuva chove na roseira
e o trem apita na estação...
É tempo de entrar no tom preciso
e adivinhar quem está tocando
as notas da intuição.

III
Ouço um sussurro na lembrança.
A saudade canta e dança
nos salões do coração.
Lembrei agora do pandeiro alagoano
e a sanfoninha conversando:
Era eu e meu irmão.
Até escuto o som correndo pela veia.
Olha o dragão na lua cheia:
Está dançando o meu baião.

IV
Toco atrás da onça e do perigo.
O som vem lá do meu umbigo.
Eu toco a linha do Equador.
Toco toco toco toco tudo,
toco cego, toco surdo,
toco tudo por amor.
  
V
Toco a luz da noite,
a luz do dia,
a luz que brilha na bacia,
nos olhinhos de uma rã.
Toco para o povo.
Eu improviso!
Sei tocar a esperança
ontem, hoje e amanhã.

VI
Eu não dependo de instrumentos pra compor.
Do fim do mundo ao começo,
não esqueço meu pai quando percebeu:
Eu era o filho do som.
Eu sou!

VI
Ponho a orelha no buraco do tatu:
Escuto a terra cantando.
Esfrego as folhas no ritmo do vegetal.


Eu tenho um avô mineral

VII

Quando nasci vi a luz musical.
Ainda vibra o primeiro sopro
e aquele impacto se prolongou
de tanto ouvir meu avô.

VIII
Ferreiro ele era,
batia nos ferros.
As sobras, me dava.
Só toco quando eu quero.
Com as sobras eu fui o primeiro instrumentador:
de um férreo varal, tocador.
Mamãe descobriu
- Divina era ela -
O Bruxo do som
ninava até as feras.
Nas sombras tocava
um pífano que eu mesmo fiz,
pr’as aves cantoras do céu.
Os sapinhos lá no brejo  
ganhavam de mim
no melhor desafio.

IX
Lá na montanha o silêncio universal
encanta o tempo
e o próprio vento espanta o medo do vendaval.
A música é doida por mim.
É sim!


X
Ouça o silêncio do som
Escute a voz musical
Siga a intuição
Criar é dom pessoal

XI
O nome Hermeto
Pascoal o compositor
Sou autodidata
O Mundo é meu professor


XII
Um copo d’água, um motor, uma lajota,
uma porta, não importa
tudo toca para mim.
Os animais de pena, pêlo, lã, escama,
avoando ou rastejando:
Todos querem me ouvir.


XIII
Alguém falando para mim está cantando:
Velho, moço e criança, qualquer homem ou mulher.
Quando eu escuto, o surdo esquece que é mudo:
De repente canta tudo.
E só não toca quem não quer.

XX
Quando eu nasci chorei aflito:
Eu tinha pressa pra tocar.
Com o meu cérebro magnético:
Hermetoado a musicar.

 O HOMEM SOM 
O HOMEM SOM
O HOMEM SOM
 O HOMEM SOM 
O HOMEM SOM













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