sábado, 16 de junho de 2018

BOLERO MÃE




MAURICE RAVEL




BOLERO DE RAVEL
Carlos Drummond de Andrade


A alma cativa e obcecada
enrola-se infinitamente numa espiral de desejo
e melancolia.
Infinita, infinitamente...
As mãos não tocam jamais o aéreo objeto,
esquiva ondulação evanescente.
Os olhos, magnetizados, escutam
E no círculo ardente nossa vida para sempre está presa,
está presa...
Os tambores abafam a morte do Imperador.






BOLERO MÃE


Letra de Numa Ciro

Para a Música de Maurice Ravel


Esta versão poética foi escrita pensando em

Aída 

que adorava ser minha mãe

e morreu, como na ópera, 

junto com seu amor, João, 

que adorava ser meu pai.


AÍDA



Ofereço às filhas pensando em nossas mães 


Escrevi esta letra ouvindo a gravação da 

Wiener Philharmoniker no Festival de Lucerna

conduzida pelo Maestro Gustavo Dudamel

1


 

Mãe
As estrelas são lanternas no céu
da criança e do pintor
Eu imitei o colibri
No Amor se brinca de morrer de amor
Batterfly não me enganou 


Mãe
As coisas são como elas são 
As coisas sem precisão
Sem razão 
Eu sei seu coração tem razão 
Ouviu meu coração em Ravel
As coisas se repetem sem ser iguais
Como são desiguais as estações

   

Mãe
Você sabe onde o sol se escondeu?
Eu brincava com a paixão
E esqueci de me esconder
Paixão é verso livre em seu querer
Mona Lisa disfarçou

B

Mãe
Os olhos fingem não querer
Parece simples fugir
Eu vi
O olhar que escapou
Não quis
Olhar o pôr-do-sol
Lá no cais
Através d’ O Grito que ecoou
Nossa dor
E a voz do poeta fingidor 

C

Mãe 
Não conheci a inocência
e fingia 
não saber o que diziam 
os boleros que você cantava
E eram cenas de amor 

 C

        Mãe
Não conheci a inocência 
e fingia
não ouvir os fados    
nas noites de serenata
e eu não dormia

2


A

Mãe
Parecia que o mundo era um só
Outros mundos descobri
Nas mil histórias que ouvi
Em cada noite antes de adormecer
Nega Zefa me contou

B

Mãe
No meu vestido de organdi
um sabiá disse assim
Vou fugir
Depois ele furou o organdi
Fugiu pro verso que diz adeus
Agora diz nesta versão de Ravel
Não não chores de amor eu voltarei 

A

Mãe
A estrada sabe aonde eu irei?
Eu brincava de fugir
Estradas andam sem andar
Ser-tão boleros pra lá e pra cá
Vi Cabíria e chorei

B 

Mãe
Meninas brincam de casar
Bonecas nascem também
sem falar
Adormecem com as canções
de ninar
Elas choram aflições de um lugar
E já morrem loucas de saudades de alguém
Logo esquecem e vivem de brincar

C  

Mãe
Não conheci a inocência
e fingia
que as mães jamais morreriam
Mas você silenciava
E eu tremia

C

Mãe
Não conheci a inocência
E fingia
Que as mães jamais sofreriam
E se você chorava
Era eu quem morria
  
3

 A

Mãe
Eu guardei tantos segredos em mim
Eu temia o nosso olhar
A mãe tem dom de adivinhar
As mães escondem a mulher de amar
Pois Medéia se enganou



Mãe
Crianças brincam de ensinar
o ABC dos mortais
É demais
O que fazem com as cinco vogais
Nos fazem parecer imortais
Depois nos roubam as certezas finais
Em segundos acordamos animais

A

Mãe
Descobri tantas verdades cruéis
Crueldade é não saber
Não tinha medo de chorar
Mesmo sabendo que a verdade dói
Choram as Plêiades no céu 

B 

Mãe 
Eu descobri as Yabás 
As deusas gregas e o céu 
das pagãs 
O cosmo das ateias e o chão 
das Amazonas e o coração 
de uma Icamiaba a se olhar ao luar 
no Espelho da Lua Yaci

 

 C

Mãe
Não conheci a inocência
E fingia
Crer em um único ser superior
Para quem você rezava
E eu duvidava

C

Mãe
Não conheci a inocência
E fingia
Não saber quem no natal colocava
os presentes sobre os sapatinhos
E eu agradecia a você

  
4


A
  
Mãe
me chamava bandoleira
Eu nasci pra vadiar
Vivia louca pra dançar
Foi quando ouvi batuques no quintal
Clementina me chamou

B

Mãe
Entrei na Roda pra sambar
Onde a tristeza aprendeu
Trocar
Os passos com a alegria
e dizer
No pé o ritmo do coração
Esse mundo é um moinho
Preste atenção
Um instrumento é bom se alguém tocar

A 

Mãe
Eu cantei com as sereias do Mar
Fiz barquinhos de papel
Um marinheiro me escutou
Fisgou meus sonhos nunca mais voltou
Afrodite me acordou

B

Mãe
As coisas belas são assim
As belas coisas serão
Sensuais
Amados não suportam rivais
Ouvi nesta versão de Ravel
Os amantes brincam em dar beijos mortais  
Disso sa-Be-a-triz em seu papel



Mãe
Não conheci a inocência
E fingia
Alegria pra não ver em você
A tristeza que era minha
E eu me perdia

C

Mãe
Não conheci a inocência
E fingia
Que as mães jamais passariam
Pela morte de um filho seu
Mãe você perdeu

5

A

Mãe
Conheci o impossível assim
Tropeçando onde não há
Nem mesmo um verso pra dizer
Onde nem mesmo nada há de haver
Alphonsina foi ao mar

B

Mãe
Parece fácil não morrer
Parece simples viver
E dizer
A terra é onde eu quero ficar
Sabendo que a canção chega ao fim
Não termina  diz  em seu bolero   Ravel
O começo de tudo está no fim

C

Mãe
Jamais perdi a inocência
Eu menti
Nesses versos que escrevi no bolero
Acredito que só as mães são felizes
e
Mãe
Eu serei
Feliz
Agora eu posso ser feliz
Alguém dirá pra mim
Eu sei fingir
Eu sei fingir que eu finjo
Sei mentir
Sobre essa dor
Sobre o amor
Toca o tambor
Do coração
Diz o refrão
Mãe quer mais
Mãe vem Mãe
Mãe quer paz
Pai


terça-feira, 5 de junho de 2018

A FEIRA GRANDE DE CAMPINA GRANDE

A FEIRA GRANDE DE CAMPINA GRANDE, Paraíba, foi inscrita pelo IPHAN, no Livro de Registro dos Lugares,  com o título de  Patrimônio Cultural do Brasil, em 27 de setembro de 2017 



IRENE MEDEIROS
Pintora campinense


PARCERIA COM HERMETO PASCOAL



Teatro Rival
Fui convidada para participar de seu concerto
Me acompanhou com um berrante.
2006
Foto de Cláudia Ferreira




A FEIRA GRANDE DE CAMPINA GRANDE


Música Hermeto Pascoal 
Letra  Numa Ciro


Quero lhe mostrar nessa cantiga:
Foi na feira de Campina 
Onde o mundo se criou.
Ouça com atenção! Na minha vida, 
Não vi coisa mais divina
Quando um cego anunciou:

Quem se aventurar nesse mercado,
Deixe aqui o seu trocado
Pelo nome de Jesus.
Eu não tive a vossa alegria
De ganhar a luz do dia.
A cegueira é minha luz.

Quase num milagre a vista alcança
Os detalhes de uma trança de cebola ou alfenim.
Acocorando escolhe coisinhas de barro
Só pensando na virtude desta mão que fez assim.
No labirinto do roteiro encomendado
Inverte a ordem do traçado quem começa pelo fim.

Corro na barraca de Zumira,
Vou buscar a lamparina,
Severina encomendou.
Olho para os lados, vejo briga,
Não é nada, é a pechincha:
Nada besta o comprador.

  

Eu e Hildebrando passeando na Feira de Campina Grande.
 Barraca Boa Vista - de Seu Aluísio -  já não está mais entre nós.
Seu filho Wilson continua lá


Quero visitar seu Aluísio
E comprar queijo de manteiga,
Apelidado de Romeu.
Quando ele se junta com o doce de goiaba,
Julieta,
Casa quem disso comeu...


Para comprar bode novo tem lei:
Pai de chiqueiro, cuidado!
O cheiro é desagradável demais, porem,
Buchada é prato de rei.
Pois, é.


Dê outra volta pra gula vestir
Carne-de-sol posta em mantas
E as linguiças, gravatas, são fashion, sei:
Luiz cantou isso outra vez.

Bonecas de pano,
Panelas de barro,
Califon de moça,
Vestidos engomados.
Pro recém-nascido: Toquinha e Casaco.
Barbeiros "Péla Porco" embelezam o passado. 
Futuro é do tempo, 
Fartura é de agora.
Quem vem nessa feira vadia pela hora.
Quem pega em rodilha não teme o balaio.
Fumo de rolo e Cachaça espanta o cansaço.
Quanto cobra pelo frete?
Eu lhe pago em dobrado
E dou mil pro assovio.





Jabuticaba, Cajá, Mimo-do-céu; 
Abacaxi, Macaíba,
Quebra-queixo, Pitomba, Castanha e Mel;
Queijo-de-coalho e Beiju.

Côco-catolé, Caju, Sapoti;
Fuba de milho, Sequilho, Rapadura
Mangaba, Graviola, Umbu;
Manteiga-da-terra e Mastruz.


Barbeiros "Péla Porco"
Fotografia de Roberto Coura - 1978


Bonecas de pano,
Panelas de barro,
Califon de moça,
Vestidos engomados.
Pro recém-nascido: Toquinha e Casaco.
Barbeiros "Péla Porco" embelezam o passado. 
Futuro é do tempo,
Fartura é de agora.
Quem vem nessa feira vadia pela hora.
Quem pega em rodilha não teme o balaio.
Fumo de rolo e Cachaça espanta o cansaço.
Quanto cobra pelo frete?
Eu lhe pago em dobrado
e dou mil pro assovio.

Não deixe a Feira sumir
Não deixe a Feira acabar
Campina Grande é ali
Grande é a feira de lá

Irene, num quadro,
A Feira imortalizou.
Irene não morre
É imortal quem pintou

Não deixe a Feira sumir
Não deixe a Feira acabar
Campina Grande é ali
Grande é a feira de lá

Irene, num quadro,
A Feira imortalizou.
Irene não morre
É imortal quem pintou 







Na Feira Grande, o primeiro Gramofone
foi o tal “bicho falante” que a cidade conheceu.
Primeiras salas de cinema inauguradas 
Foi na Feira de Campina que a imagem se mexeu

Na Feira Grande de Campina Grande cantam
Asa branca, Miudinho, Bem-te-vi, meu Sabiá.
Até o Galo de Campina se casou 
Com a Noivinha Coroada e fizeram ninho lá.

P’a quem quiser tocar na feira:
Na feira encontra a condição.
Tem fole e sopro cordas e teclas. 
O que não falta é percussão.



Foto de Cláudia Ferreira





Gravada no Estúdio de Ricardo Calafate
Arranjo de Itiberê 
Músicos de sua orquestra
Vozes de Numa Ciro
Socorro Lira
Tadeu Mathias
Coro Lan Lanh, Jussara Silveira, Bia, Numa, Alba Lírio